Por Paula Reverbel da Folha de S.Paulo
A Operação Lava Jato vem trazendo preocupação aos advogados que atuam em favor dos acusados. De acordo com Augusto de Arruda Botelho, presidente do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa) e advogado da Odebrecht na Lava Jato, o combate à corrupção, embora urgente, deve respeitar garantias fundamentais. “É o preço que se paga por viver no Estado democrático de Direito”, diz ele. “Me incomoda esse discurso de caça às bruxas”.
Em entrevista à Folha, Botelho apontou aspectos da operação que, segundo ele, afrontam o princípio do contraditório. Como trabalha na defesa de réus da Lava Jato, não quis comentar casos específicos.
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Folha – Quais são os maiores obstáculos ao direito da defesa encontrados na Lava Jato?
Augusto Botelho – A falta de acesso às informações da acusação, no caso de procedimentos sigilosos, dificulta o trabalho. Em alguns casos, o acesso a materiais muito extensos é dado horas antes de um ato processual. Também há a postura do juiz Sergio Moro, que comenta a conduta dos advogados. Não se pode confundir o papel do advogado com os delitos de que os clientes são acusados.
Quando cabe prisão preventiva ou condução coercitiva?
A prisão antes de condenação requer elementos concretos de que, em liberdade, o réu pode fugir, destruir provas, ou fazer algo que justifique a prisão. Mas os argumentos trazidos são exercício de futurologia. O tempo verbal usado nos despachos diz que o réu “poderá” influenciar na coleta de provas. Não diz: “peguei ele destruindo uma prova”. E a condução coercitiva deve ser usada quando alguém dá demonstrações de que não quer colaborar com as investigações.
O que acha das declarações do juiz Moro sobre a Lava Jato?
Um juiz tem todo o direito de se manifestar sobre a corrupção em sentido amplo. Mas se ele fala de um processo que ele julga, essa manifestação deve ser feita nos autos. A corrupção é um mal que precisa ser enfrentado de forma veemente. Mas esse combate deve ser sempre feito no estrito respeito aos direitos. Esse é o preço que se paga por viver no Estado democrático de Direito. Fico incomodado com esse discurso de caça às bruxas, de que corrupção deve ser combatida de qualquer forma e a qualquer preço.
O que acha das medidas anticorrupção propostas pelo Ministério Público Federal?
Eu acho preocupante, pois uma série das dez medidas propostas são ilegais. E na coleta de assinaturas, as pessoas leem só o enunciado.
Caso aprovadas, acredita que seriam contestadas na Justiça?
Certamente. E me preocupa o uso desse formato marqueteiro para tratar de um problema tão grave. Não é com com festas e marketing que você vai modificar um histórico de corrupção.
Qual será o saldo da Lava Jato?
Acho que é um divisor de águas, por introduzir de forma maciça o uso da delação premiada em processos e também pela crítica que eu já fiz da banalização e de prisões que são desnecessárias.
Que tipos de comentários o juiz Sergio Moro fez sobre os advogados?
Há despachos pedindo urbanidade do advogado. Há vários momentos em que o juiz é contundente em relação ao trabalho da defesa.
Ele estava querendo passar um pito na conduta dos advogados?
É, é exatamente isso.
Texto publicado originalmente na Folha de S. Paulo.