Medalha de bronze. Na voz do locutor esportivo: “O Brasil no pódio!”. Tudo isso seria ótimo se não fosse a categoria: somos o terceiro país que mais encarcera no mundo. Por outro lado, nossos índices de criminalidade só aumentam e a sensação de insegurança atingiu níveis alarmantes. O fato inconteste é que nossa estratégia de punição falhou. Prendemos e não ressocializamos, punimos os pequenos e muitas vezes nem sequer investigamos os grandes, combatemos os sintomas sem procurar estancar as origens da doença e com isso vivemos com a falsa esperança
de que o Estado está cumprindo seu papel.

Voltando ao ranking, o Brasil tem hoje quase 800 mil presos. As condições das prisões são sabidas e o problema da superlotação das cadeias só corrói ainda mais nossa engrenagem. A solução, por outro lado, é mais simples do que possa parecer. Precisamos prender mais quem realmente precisa estar preso, aplicar medidas alternativas para aqueles que cometeram pequenas infrações e, para sanar a grave situação dos presos provisórios (quase a metade dos nossos encarcerados são presos provisórios), precisamos ter uma justiça mais rápida e mais eficaz.

Para tentar amenizar o problema, implementamos no país o maior avanço no sistema de justiça criminal das últimas décadas: as audiências de custódia. Para quem não sabe, o sistema anterior funcionava assim: alguém era preso em flagrante por furto qualificado, por exemplo; essa prisão era convertida em prisão preventiva
e a pessoa respondia, na maioria das vezes, ao processo presa. Entre a data da prisão em ‰agrante e o primeiro momento em que este acusado era colocado frente a frente com um juiz, poderiam passar meses. E muitas vezes, após meses preso preventivamente, era tal sujeito colocado em liberdade. O que a audiência de custódia fez, aplicando finalmente as convenções e tratados de que o Brasil já era signatário, foi antecipar esse encontro pessoal do juiz com o preso para até 24 horas após a prisão. O resultado inicial, ao menos na cidade de São Paulo, tinha sido mais do que satisfatório. Em média 50% dos presos eram mantidos presos, enquanto a outra metade (presos em regra primários e acusados de crime sem a prática de violência) ganhava o direito de responder ao processo em liberdade. Em muitos dos casos, tal liberdade era relativa, já que vinha com restrições como monitoramento eletrônico e outras medidas cautelares alternativas à prisão. Um enorme avanço.

O que se verifica atualmente, no entanto, é a brutal mudança no índice de manutenção das prisões em flagrante. Dados recentes, fornecidos pela Defensoria Pública de São Paulo, indicam que, de fevereiro a julho de 2018, a média de manutenção de prisões nas audiências de custódia foi de 64%. Os números são muito mais expressivos quando a estatística se restringe aos casos de prisão por tráfico de drogas, hipótese em que a prisão foi mantida em 83% dos casos, tudo a demonstrar que a prisão preventiva, tida pela doutrina como última medida, é a regra, inclusive em casos de réus primários presos com íntima quantidade de drogas.

Não estamos aqui defendendo a soltura indiscriminada de presos em flagrante, mas apenas e tão somente a aplicação do texto legal: a prisão antes da condenação é excepcional, e medidas cautelares alternativas devem sempre ser aplicadas quando o caso permitir. Prender o jovem, primário, por crime praticado sem violência serve para bem pouco. A história, o atual estágio das coisas e a estatística são as maiores provas disso.